sábado, 1 de agosto de 2009

Incra entra com pedido no Supremo para defender o Decreto nº 4887

Por Flavia Bernardes

O Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) entrou com um pedido amicus curiae no Supremo Tribunal Federal (STF) para defender a manutenção do Decreto nº 4887, que estabelece procedimentos para a titulação de terras para quilombolas. O decreto é contestado em Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) protocolada pelo DEM há cinco anos.

A ação, caracterizada como amicus curiae – amigo da Corte, ou seja, não é amigo das partes –, tem a função de chamar a atenção da Justiça para fatos ou circunstâncias que poderiam não ser notados.

Com isso, o Incra espera que os ministros do STF e membros Congresso Nacional, por onde o DEM quer que a regulamentação do artigo passe, possam conhecer os procedimentos de reconhecimento e titulação aplicados pelo órgão, assim como as implicações sociais da derrubada do decreto. O processo tem como relator o ministro Cezar Peluso e pode ser julgado este ano.

O Incra alerta que, com a queda do decreto, as titulações baseadas nele podem ser questionadas e o processo de regularização poderá ficar sem regras.

No Estado, uma comissão chegou a ser formada para reivindicar que o decreto fosse mantido. Para os membros dessa comissão, a queda do decreto significaria um retrocesso para as comunidades negras do Estado, além de representar o desejo de uma classe que não permite que o direito dos negros seja concedido.

Este impasse vem sendo um dos entraves para a titulação de terras quilombolas. Ao todo, cinco comunidades no norte do Espírito Santo possuem processos paralisados no Instituto Nacional de Reforma Agrária (Incra) há pelo menos um ano. São eles os processos das comunidades quilombolas de São Cristóvão, São Domingos, Serraria, Linharinho e Bacia do Angelim.

Além disso, resistem no norte do Estado 38 comunidades quilombolas em meio ao impacto de plantios de eucalipto, relegadas ao isolamento, à falta de saneamento e ainda sob o abandono das autoridades. Sozinhos e sem trabalho na região, eles sobrevivem da cata dos restos de eucalipto para a produção de carvão e da venda do beiju.

Estas comunidades estão situadas na região do Sapê do Norte, que compreende partes dos municípios de Conceição da Barra e São Mateus, onde áreas de remanescentes quilombolas são reivindicadas pelos negros há anos.

Segundo o movimento quilombola, existem cerca de cinco mil comunidades no País, mas até hoje cerca de 80 conseguiram o título de propriedade – que é coletivo, expedido em nome da comunidade – com base no decreto. O documento de propriedade assegura soberania dos quilombolas sobre seu território, garantindo-lhes condições de existência.

O Decreto 4887 é o principal instrumento de defesa do governo brasileiro na Comissão Interamericana de Direitos Humanos, onde tramita ação por violação de direitos dos quilombolas. Sem ele, a situação dos quilombolas, que já é insustentável, ficará ainda pior.

Prova da situação crítica enfrentada por estas comunidades são os 15 pedidos de audiência pública protocolados desde 2004, sem que nenhuma tenha sido realizada até hoje. Um dos pedidos foi feito pela Advocacia-Geral da União (AGU), que, pressionada pelos movimentos sociais e ativistas de direitos humanos, requereu uma audiência, mas também não foi atendida.

Neste contexto, os quilombolas lembram que o decreto elenca princípios básicos como a autodefinição, assegura que a terra ocupada não é espaço meramente destinado à habitação, preserva o espaço para o desenvolvimento econômico, cultural e social das comunidades, além de caracterizar a propriedade como coletiva e não alienável.

Integrantes da Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq), inclusive do Espírito Santo, estiveram em Brasília no último mês reivindicando a manutenção do decreto. Eles foram ao Ministério do Desenvolvimento Agrário e ao STF, mas não obtiveram nenhuma resposta das autoridades.

Fonte: Século Diário

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